Certas
canções trazem um saudosismo que nem sei definir. A versão de Trac Trac, dos
Paralamas, composta por Fito Paez, me remete a algo que já toquei, que já
provei, mas que não sei se é quente, se é frio, não sei o gosto. É uma memória
de amnésia, toda estranha e ao mesmo tempo saborosa. Tem um que de
adolescência, de liberdade, de amor. Mas tem um pouco de solidão, de
desentendimento, de sofrimento. Algo assim, ambíguo, com cenários litorâneos,
gaivotas em voos rasantes ao mar, cheiro de peixe, tempo nublado, crianças
jogando bola e um walkman. MTV, pornografia barata, noites sem dormir, pingado
no bar, coxinha de frango, picolé de água, bicicleta Monareta.
O
refrão, mantido no original, cantado em espanhol, com os vocais da Fernanda
Abreu, o dedilhado distorcido da guitarra, o teclado acompanhando a melodia,
tudo me leva a um sentimento único e inexplicável, um não-invento de algo já
existente, no entanto, difícil de transcorrer em vogais, consoantes, sílabas.
Qualquer palavra serve.
O
coração bate por um liquidificador de emoções. Mas quais? Sei não. A letra me
confunde, me acalma. Um enigma delicioso, como o timbre do contrabaixo, com
forte marcação, reto, direto. O que importa? É o gostar e o turbilhão
sentimental que a canção remete, como deve ser os relacionamentos, as amizades,
os amores, as atmosferas, o trabalho, a vida. A minha. E a sua.